BALANÇO DOS 5 MESES DE LUTA ARMADA NA REGIÃO DO ARAGUAIA
I – ASPECTO POLÍTICO
A existência da luta guerrilheira no Sul do Pará, durante 5 meses, representa uma grande vitória do povo brasileiro no combate à ditadura e pela emancipação nacional. Nenhuma corrente política de esquerda conseguiu manter-se tanto tempo enfrentando, de armas na mão, as forças reacionárias. Começou uma nova fase na luta do povo brasileiro contra a ditadura militar. Neste luta verificou-se uma mudança de qualidade com o surgimento da guerrilha na Amazônia.
A luta armada no Sul do Pará enquadra-se no quadro geral da luta pela liberdade e contra o imperialismo norte-americano. É um poderoso exemplo para o povo, para todos os democratas e patriotas. É da maior importância para o desenvolvimento da guerrilha a amplitude da bandeira política que ela desfralda: torna-la uma luta de todo o povo. /a ação guerrilheira na Amazônia representa papel de catalisador para desencadear outras lutas. Sob o estímulo da guerrilha, tais lutas podem se espraiar por todo o país. A ditadura teme a guerrilha porque seu exemplo pode frutificar. Daí resulta a pesada censura do governo à imprensa, ao rádio e à televisão sobre os acontecimentos na região do Araguaia. Mas à medida que a ação guerrilheira se desenvolve, o povo irá mais e mais tomando conhecimento do que ocorre na Amazônia.
Nosso objetivo estratégico nesta fase da luta armada é sobreviver. Mas sobreviver não significa unicamente continuar a existir, mas crescer e se consolidar. Em 5 meses as forças guerrilheiras avançaram bastante. Hoje elas tem mais experiência de vida na mata e domínio do terreno; ampliaram e fortaleceram suas ligações com as massas; conhecem melhor o inimigo, sabem quais são seus pontos débeis e seus pontos fortes. Os fatos indicam que as FF GG têm condições de avançar e se desenvolver, que a orientação política e a linha militar do P são justas e que só seremos derrotados se fugirmos da aplicação de nossa concepção de luta armada, se cometermos erros essenciais, irreparáveis.
Repercussão política da luta armada na região – As massas camponesas das diferentes áreas foram despertadas para a vida política com o desencadeamento da guerrilha: avançaram dezenas de anos no que diz respeito à sua consciência política. No seio das massas dá-se uma polarização. Os contingentes que se manifestam a favor das FF GG constituem a imensa maioria da população local. Com o surgimento da luta armada, crescem as contradições sociais (camponeses dispõem-se a enfrentas os grileiros, a não pagar ao INCRA, etc). A luta guerrilheira está no centro de todas discussões dos camponeses. Nas cidades, vilas e lugarejos da periferia da região rebelada também reflete-se favorablemente a luta armada.
Conclusão: a situação local nos é favorável como também é favorável a situação nacional e internacional.
II – ASPECTO MILITAR
Tanto as FF GG como o Exército ainda tateiam no terreno, não se empenharam em ações militares importantes. Ambas as forças militares não têm experiência de guerra de guerrilhas.
SOBRE AS FORÇAS GUERRILHEIRAS
As FF GG permanecem com o mesmo poderio do início da luta, apesar das perdas sofridas.
Em certo sentido, avançaram bastante, melhoraram em qualidade e na ligação com as massas. Desenvolveu-se a capacidade militar de todos os combatentes. Passemos a analisar a situação por D.
DA: não teve perdas e melhorou seu espírito de combate. Cresce o número de seus combatentes que dominam o terreno, sabem viver na mata e aperfeiçoam suas qualidades militares. Mantém incólume sua organização militar e seu comando vem funcionando normalmente. Seu contato com a CM não sofreu interrupção. Apoiado na massa, solucionou em parte seus problemas de abastecimento que, no início da luta armada, praticamente não existiam. Melhorou seu poder de fogo. Realizou bom trabalho de massas (visitou mais de 75 famílias) e conseguiu sólido apoio de elementos da massa (embora seu número ainda seja pequeno), o que possibilita organizar um núcleo do MLP e abre perspectivas de recrutamento para as FF GG. Seu lado negativo consiste em não ter realizado ainda ação contra o inimigo nas manifestações de rotina e de relaxamento da vigilância.
DB: Teve duas perdas (um aprisionado e outro morto), mas não teve diminuída sua capacidade de combate. Cresce também o número de seus combatentes que melhor dominam o terreno e a vida na mata e que se desenvolvem do ponto de vista militar. Está em dificuldades no que se refere ao abastecimento através da massa, embora ainda conte com alguns depósitos de farinha e feijão. Teve reduzido seu poder de fogo (perdeu 4 armas). Seu trabalho de massa ainda é pequeno (visitou apenas 23 famílias) e seu Comando revela falta de confiança nas massas. O Comando não funcionou normalmente: perdeu, durante quase 2 meses, o contato com o grosso dos combatentes e com a CM. O Comando incorreu num excesso de vigilância, o que leva a ter espírito defensivo. Superestima o adversário. Realizou ação contra o inimigo, causando-lhe baixas, fato que repercutiufavoravelmente às FF GG. Sob a direção da CM, uma parte de um G do D realizou bom trabalho na área do DC (visitou 40 famílias) e portou-se bem diante do inimigo quando foi por este emboscado, retirando-se sem perdas. As dificuldades que o D enfrenta são facilmente superáveis.
DC: Teve 6 baixas, entre prisioneiros e mortos (um terço dos seus efetivos), o que constitui um rude golpe para o D. Parece estar desarticulado e atuando em 3 áreas com 3 grupos separados, fato que reduz sua capacidade de luta. Seu trabalho de massas parece ser pequeno (poucas foram as casas onde Ju esteve que foram visitadas pelos combatentes doD). Revela completa falta de vigilância, particularmente em suas relações com as massas.
Está totalmente desligado da CM. O D corre grave perigo no que diz respeito à sobrevivência. É tarefa urgentíssima sua ligação com a CM. Pelas informações obtidas o DC parece ser o ponto mais débil das FF GG, embora nele se encontrem bons e experimentados combatentes.
A tática dos DD está quase que exclusivamente voltada para o trabalho de massas e para o abastecimento (embora não se tenham explorado a maior parte das possibilidades que existem nesse terreno), enquanto a ação militar está colocada em segundo plano. Isso representa séria falha. É preciso estudar melhor a maneira de atuar e elaborar planos concretos de ação contra o inimigo. A passividade pode representar o fim da guerrilha. Ca C de D deve ter a sua tropa na mão, tanto na dispersão (trabalho de propaganda revolucionária) como na contração (operações militares) para agir com eficiência contra o inimigo.
A CM tem funcionado normalmente e tem sido bastante útil para as FF GG. Mas debe Ter mais em conta a realidade de cada D e não ficar somente nas ordens e diretrizes. A CM deve não só controlar as atividades dos DD, como também precisa ajudar na realização das tarefas (no DA pode-se se seguir uma norma, no DB outra, e assim Por diante). Uma das principais falhas da CM é não Ter contato com o P, contato que tem primordial importância para o desenvolvimento da luta armada na região do Araguaia. No fundamental, tem sido positiva a existência da CM, que assegura uma atividade coordenada e centralizada das FF GG, possibilita a troca de experiência e de informações dos diferentes DD e garante a execução de uma orientação que se tem revelado correta. CONCLUSÃO: As FF GG têm boa perspectiva de crescer e se consolidar. O maior perigo está em nós mesmos. Isto é, na superestimação de nossas forças e de nossas possibilidades reais.
SOBRE AS FF AA DA DITADURA
O inimigo tem extensa frente a atender, que vai de Marabá até Xambioá (vai um pouco além desta cidade). Por isso tem de mobilizar numerosos efetivos, que, apesar de seu vulto, não atendem às suas necessidades de golpear seriamente as FF GG. AS tropas da ditadura estão dispersas em várias cidades e lugarejos da Belém-Brasília, dos rios Tocantins e Araguaia. O moral das tropas do inimigo é baixa. Os camponeses informam que os soldados revelam medo. Até hoje os milicos não se encorajaram a penetrar na mata. As patrulhas do Exército andam somente pelas estradas, caminhos e excepcionalmente picadas.
Os êxitos obtidos pelo inimigo resultam de nossos erros e não de sua tática e capacidade militar. As forças repressiva têm espírito defensivo, revelam displicências, afoitezas e completa falta de vigilância. Isso favorece a realização de ações ofensivas de nossa parte (emboscadas, assaltos e fustigamentos). A tática do Exército consiste em apoiar-se em cidades, corrutelas, fazendas e bases (barracões) e em patrulhas que vagueiam a esmo pelas estradas e caminhos. Atualmente, as FF AA da reação situam-se em Marabá, Araguatins, Metade, Oito Barracas, Fazenda do Mano Ferreira, Bom Jesus, Brejo Grande, Palestina, Santa Cruz, Xambioá, Mutum, Castanhal da Axixá, Fazenda do Paulista (Nemer), Abóboras, Viúva, Araguanã, Caiano (patrimônio). Nem sempre todos esses lugares têm soldados. A ditadura transformou a estrada Marabá-S. Geraldo, que só dava passagem a burros, em estrada de rodagem. O inimigo pretende, com todas essas medidas, realizar um cerco estratégico às FF GG. Mas esse cerco, com as tropas que a ditadura mobilizou, é impossível. Em relação às massas, o inimigo usa uma tática dupla: a violência e a demagogia (exemplos), mas acabará predominando a violência. O inimigo muda com freqüência suas tropas, fato favorável às FF GG.
Conclusão: se as FF GG aplicam fielmente nossa concepção militar, se souberem usar habilmente a tática de guerrilhas, o inimigo não passará de um tigre de papel. As tropas que atuam na região revelam pouca eficiência militar (exemplos: na emboscada ao Ju não causaram baixas; na emboscada ao Grupo do Paulo só causaram uma baixa; na área do DA as patrulhas se expõem inutilmente.
III – ASPECTO DAS MASSAS
As FF GG no seu trabalho de ligação com as massas, alcançaram êxitos relativamente bons. Não ficamos isolados ( ao contrário de Guevara naBolívia), nem o inimigo conseguiu dar aos camponeses e demais habitantes da região uma imagem falsa a nosso respeito. Caiu no vazio sua tentativa de nos apresentar como criminosos e marginais. As FF GG já entraram em contato direto com cerca de 150 famílias. Está do nosso lado a simpatia da grande maioria da população local. Mas, há de nossa parte muita defensiva em procurar as massas. Revelamos a tendência de procurar apenas os elementos conhecidos. Não confiamos suficientemente nas massas. Por outro lado, manifestamos confiança excessiva em pessoas que eram amigas antes do desencadeamento da luta armada ou nos camponeses que nos acolham bem, o que acarreta grandes riscos para a segurança dos combatentes. Os fatos verificados no DC são umexemplo. É imprescindível travar árdua luta pela conquista das massas. O inimigo pressiona os camponeses, procura suborná-los para transformá-los em delatores, difundem entre eles calúnias e mentiras a nosso respeito. Devemos responder a essa atividade da reação com nossa propaganda, com o nosso comportamento correto e com demonstrações de que podemos vencer os soldados da ditadura. Geralmente os delatores e vacilantes surgem entre os elementos de massa que ainda não foram alvo de nossa propaganda. No nosso trabalho de propaganda revolucionária ocupa lugar de grande destaque o Manifesto do Movimentode Libertação do Povo (MLP). Devemos trabalhar sempre com ele. Toda vez que é lido e explicado, os camponeses o aplaudem e muitas vezes tornam-se amigos. Através de justaorientação política ganharemos as massas. Posição das classes menos pobres da população: muitos de seus elementos simpatizam conosco ou são neutros (dar exemplos).
Conclusão: Podemos afirmar que as massas da região simpatizam com a nossa causa e tendem a nos apoiar cada vez mais. Essas massas podem ser assim classificadas: os amigos (que estão politicamente conosco e ajudam as FF GG); os que simpatizam com os guerrilheiros (constituem a maioria); e os que estão com o inimigo (são uma ínfima minoria). Quanto aos bate-paus, são pessoas corrompidas e desclassificadas, que devem ser tratadas como inimigos. Desde já, é preciso começar a organizar as massas no MLP e recrutar os mais combativos, principalmente os jovens, para as FF GG.
IV - MEDIDAS PRÁTICAS
Devemos programar nossas atividades até o fim do ano. Precisamos aproveitar o resto do verão e nos preparar para o inverno. Providências concretas terão que ser tomadas, tendo em vista intensificar o trabalho das FF GG entre as massas. Desde que as condições permitam, toda família, conhecida ou não, tem que ser por nós visitada e trabalhada pelos nossos propagandistas. Não podemos abandonar ninguém, disputando com a reação, palmo a palmo, a influência sobre qualquer parcela de camponeses. É também indispensable planificar nossa atividade militar, afim de assestar golpes no inimigo (para abalar seu moral e dar demonstração de força), tomar armas, roupa e calçados, e tornar difícil a vida dos soldados na região, Neste sentido, devemos atuar nas áreas mais diversas para desorientar as forças repressoras da ditadura e planificar emboscadas, ocupação de corrutelas, fustigamentos, colocação de minas, etc.
Precisamos espalhar boatos para inquietar o inimigo (dizer às massas que vamos assaltar Marabá ou Araguatins e aparecer em outro lugar que o inimigo não conta). Em ligação com tudo isso, planejar o reabastecimento para 6 meses. Guardar farinha e milho. Organizar a caça. Conseguir roupas e botinas.
Quais as medidas a tomar?
1. Elaborar planos concretos de operações contra o inimigo.
DA: Preparar uma emboscada; soltar dois ou mais grupos (de 2 co cada um) para realizar fustigamento; desde que haja condições, preparar um ataque a corrutela (S. Domingos, Brejo Grande, Palestina). Pode ser em coordenação com o DB; preparar uma mina.
DB: Preparar uma emboscada; soltar um mais grupos (2 co cada) para realizar fustigamento; desde que haja condições, preparar ataque a uma corrutela (Santa Cruz, Palestina) em coordenação com o DA; preparar uma mina.
DC (se for feito o contato): Preparar emboscada; soltar um ou mais grupos (2 co cada) para realizar fustigamento; preparar ataque a corrutela (Itaipava, Araguanã) ou à derrubada do Antoninho.
2. Intensificar o trabalho de abastecimento
DA: 10 sacos de milho; 20 quartas de farinha; desenvolver a rede de fornecedores; preparar recipientes para o armazenamento de mercadorias (sacos, paneiros, jacás, etc); organizar um grupo de caça.
DB: 6 sacos de milho; 15 quartas de farinha; desenvolver a rede de fornecedores; preparar recipiente para o armazenamento de mercadorias (sacos, paneiros, jacás, etc); organizar um grupo de caça.
DC: Planejar conforme as condições.
3. Insistir na organização do serviço de informações apoiado nas massas e destacar co para observar o inimigo.
4. Prosseguir na propaganda armada para ganhar amigos e explicar às massas as razões da nossa luta. Utilizar o Manifesto do MLP, Carta ao Bispo, Carta do Osv aos Amigos, Carta do dr. João Carlos e outros documentos.
DA: Metade, Canadá e área acima da barra do Fortaleza.
DB: Caminho da Palestina e Restante do Saranzal.
DC: Formiga e Caiano.
5. Prosseguir na pesquisa do terreno e na elaboração dos croquis.
6. Obedecer as normas de segurança no trabalho de massas.
7. Rever o sistema de ligação: D-GG-CC e DD-CM.
CONCLUSÃO FINAL
Em nossa atividade devemos nos ater às seguintes normas:
1. Começada a nossa luta, devemos levá-la até o fim. A palavra capitulação não faz parte do nosso dicionário. Devemos ser persistentes e confiar na vitória. Embora nosso inimigo seja numeroso e bem armado, defende uma causa injusta. As tropas da ditadura são um colosso de pés de barro.
2. Para que possamos sobreviver e crescer, as forças guerrilheiras precisam dominar a mata, conhecê-la como a palma da mão, torná-la uma retaguarda segura. Necessitam ligar-se mais às massas. Apoiados nas massas e na mata, atacaremos com êxito o inimigo. Sem as massas, não poderemos avançar, crescer e nos consolidar.
3. Em nossas operações militares devemos concentrar, no lugar e no momento mais favorável, forças superiores às do inimigo, conhecer seu lado forte e suas debilidades, acompanhar seus passos e estar muito bem informado sobre ela.
4. Em nossas operações militares precisamos agir com decisão e ter o máximo de iniciativa. A passividade seria a morte da guerrilha. É necessário ter a maior audácia, sem cair em aventuras; possuir espírito ofensivo, sem cometer facilidades; evitar sempre a rotina e a falta de vigilância, sem se deixar dominar pela desordem e a falta de planificação.
5. Em nossas operações militares devemos nos esforçar ao máximo para apanhar o inimigo desprevenido e pouco vigilante; aproveitar o momento em que suas tropas estejam dispersas, para assestar-lhes golpes; procurar sempre desnorteá-lo, agindo nos lugares mais diversos; desinformá-lo para que aja tímida e desordenadamente.
6. Em nossas operações militares, visar sempre a obtenção de êxitos continuados, embora pequenos, sempre mais numerosos, a fim de manter nossa superioridade moral e intensificar o crescimento e a consolidação de nossas FF GG.