BALANÇO DA LUTA GUERRILHEIRA NO ARAGUAIA DESDE O ANO PASSADO
Estamos chamados a fazer um balanço de 10 meses de luta armada, isto é, desde o momento em que terminou a última campanha do Exército contra as FF GG. Estas, a partir de outubro do ano passado, estenderam sua influência sobre as massas da região, atingindo, nesse terreno, um nível bastante alto. Isto lhes propiciou e propiciará no futuro, em escala muito maior, intensa penetração política entre o povo, melhor abastecimento, boas informações e novos combatentes para as fileiras da guerrilha. Nossos destacamentos estão hoje, apesar das perdas sofridas nos primeiros 6 meses de atividade, em melhores condições de enfrentar o inimigo, do que no início da luta armada. Pensamos que este balanço só poderá ser mais ou menos satisfatório depois das intervenções de todos os co, CC e VVCC, que estão dirigindo diretamente a luta guerrilheira em todos os seus aspectos. Para abrir a discussão, faremos uma síntese de nossas experiências no período que estamos analisando.
Antes de tudo, precisamos assinalar, com bastante ênfase, que a existência da guerrilha no Brasil, onde não havia nenhuma experiência de luta guerrilheira, durante um período tão longo, de 16 meses, constitui, por si só, enorme êxito. Tal fato vem tendo grande repercussão no desenvolvimento da situação política, em especial das lutas populares, tanto no campo como na cidade. É indispensável ter sempre em mente que o papel que as FF GG desempenham, como exemplo e fator de inspiração, para fazer avançar o movimento revolucionário.
Comecemos com um exame de situação das FF GG: reorganizamos nossas forças, em particular o DC. Todos os DD estão sob controle da CM; melhoramos a capacidade militar dos combatentes. Avançamos no conhecimento do terreno e no domínio da mata; realizamos algumas ações que, embora pequenas, tiveram repercussão entre o povo (contra o barracão do capitão Olinto, contra a fazenda do Paulista, ocupação de Bom Jesus, etc); ampliamos nossa área de ação (exemplos dos DD); resolvemos, em certa medida, nossos problemas de abastecimento. Temos reserva de alimentos para 6 meses. solucionou-se a falta de calçados. Mas ainda são grandes nossas deficiências no que se refere a equipamento; melhoramos nosso armamento. Conseguimos 9 rifles 44, 9 espingardas 20, um rifle 36 e 4 revólveres (apoiados na massa e por ação militar). Consertamos quase todas as armas. Não há nenhum combatente desarmado. Mas comparado com o armamento do inimigo,, o nosso armamento é deficientérrimo. Carecemos de balas 44 e de munição. Precisamos de minas, granadas e de armas modernas. Nosso poder de fogo ainda é pequeno; desenvolvemos um trabalho de propaganda relativamente bom. Imprimimos material que foi distribuído em S. Domingos, Palestina e S. Geraldo. Destaca-se o “Romance da Libertação do Povo”. Aumentou o número de nossos agitadores e melhorou a sua qualidade. No entanto, é pequeno o trabalho de educação política e ideológica com os combatentes; enfrentamos com êxito as doenças, apesar da falta que o Juca nos faz. É bom o estado físico dos combatentes; enfim, é bastante alto o moral das FF GG. Melhorou grandemente seu aspecto disciplinar.
Poucos são os casos de indisciplina (Mané, Ari, etc).
Nossos maiores êxitos estão no trabalho de massas. Deste trabalho depende a maior parte das vitórias da guerrilha. Hoje, já é difícil fazer estatística do trabalho de massas, tal o seu crescimento entre os camponeses. conseguimos dezenas de amigos firmes; conseguimos mais de 10 núcleos da ULDP; conseguimos ligações com as corrutelas; alimentar os guerrilheiros é, para as massas, quase uma lei (exemplos de ZC, Dina e Mundico); realizamos trabalho físico juntamente com as massas (broque, colheita de arroz, etc); a opinião pública da região está ao lado das FF GG, apoiam a guerrilha os terecoseiros, os padres e os crentes; elementos da massa que se apoderaram de nossas coisas, devolveram-nas. Bate-paus pedem clemência; eleva-se o nível de consciência política da população local. Alguns elementos da massa ouvem diariamente a Rádio Tirana. Grande é o número de camponeses que são propagandistas da guerrilha; pessoas de projeção de algumas corrutelas procuram contato com os guerrilheiros, descortinando uma perspectiva de organizar a frente única; em vastas áreas somos reconhecidos como autoridades. Por que tivemos êxito no trabalho de massas? porque nossa linha política, bastante ampla, de concentrar o fogo na ditadura, é justa; porque nossa linha de massas, de não causar nenhum dano aos camponeses e a todos que não estão comprometidos com o inimigo, de ajudar sempre os camponeses, é correta; porque nossa linha militar é acertada e conseguimos resistir à poderosa investida do inimigo; porque estamos há bastante sozinhos em vastas áreas, pois o inimigo não aparece, e nos transformamos em autoridade.
Mas, nesse período que estamos analisando, o inimigo nos assestou sério golpe, ao atingir duramente o P nas cidades. Perdemos contato com o P, nosso principal esteio político. É da maior importância o apoio da cidade à guerrilha. A cidade pode nos dar ajuda material, enviar novos combatentes, desenvolver intensa propaganda das FF GG, etc. apesar do golpe desfechado pela reação, aumentou a solidariedade à guerrilha, tanto no Brasil como no exterior (pichações em S. Paulo e na GB, artigos na “Classe”, Libertação, Jornal Livre, manifestações de apoio na Albânia, Chile, França, Bélgica, etc.
Qual a perspectiva para a luta armada na região? Não podemos prever com exatidão o curso dessa luta, mas desde já podemos aquilatar a sua tendência geral. A vida comprovou a justeza de nossas concepções e muitas de nossas previsões. Agora, temos suficientes experiências para descortinar a perspectiva de nossa luta em todos os terrenos: na esfera militar, no trabalho de massas (propaganda e organização), no abastecimento, no recrutamento, etc. Podem ocorrer situações especiais que podem alterar o rumo da luta armada na região (grandes movimentos de massas nas cidades, maiores choques entre as classes dominantes, uma solução reformista para a situação nacional, etc). Mas não podemos basear nossos planos em tais possibilidades. Precisamos prever o curso da luta em nossa região baseados nas possibilidades locais que podemos vislumbrar em 16 meses de guerrilha. O que surgir de positivo fora dessa previsão será mais vantagem para nós.
Nossa perspectiva na região é criar uma área liberada, conquistar uma base de apoio. Isto, por enquanto, é só uma perspectiva, mas nós avançamos muito nesse sentido. Surgem os primeiros embriões da área liberada.
Numa das aulas do curso de preparação militar dizíamos que, iniciada a guerrilha, esta passaria por um ponto crítico, a partir do qual não seríamos mais derrotados. Não temos dados suficientes para afirmar que ultrapassamos tal ponto, mas podemos desde já asseverar que atingimos uma situação em que só seremos desbaratados se cometermos graves erros. Por que? porque temos atualmente maior domínio da arte militar, isto é, da guerra de guerrilhas; porque possuímos maior conhecimento da selva; porque aumentou consideravelmente nossa ligação com as massas da região. Estas, em sua grande maioria, estão conosco; porque garantimos, embora de maneira ainda insuficiente, nosso abastecimento, através das massas e da mata; porque existe uma situação nacional favorável ao desenvolvimento da luta armada.
Nossa perspectiva é de uma guerra prolongada. É preciso ter isso sempre em conta. Daí a importância da orientação de economia de forças. Neste momento, tudo devemos fazer para não perder ninguém. Só atacar tendo certeza do êxito. Não arriscar tudo. Obedecer rigorosamente as normas e regulamentos das FF GG. Quando necessário, recuar sem temer que possam pensar que fugimos da luta. Devemos Ter a maior prudência nas ações punitivas. Não desperdiçar forças e nem jogar com a vida dos combatentes, considerando que as atuais FF GG são o núcleo fundamental de uma grande força armada revolucionária a se criar no futuro.
Nossa experiência mostra que o inimigo atua de 3 formas: com pequenos efetivos (de junho a setembro de 1972); com grandes efetivos (campanhas de abril-maio de 1972 e de setembro-outubro do mesmo ano); sem empregar efetivos militares na região, deixando seus contingentes na periferia ou aparecendo esporadicamente com pequenas unidades. Ao mesmo tempo, procura esvaziar a guerrilha através da Operação ACISO, de demagogia, de pequenas concessões à massa, do INCRA, etc (outubro de 1972 até agora).
O inimigo pode combinar o emprego dessas formas de atuação. Como atuar nos 3 casos?
No primeiro, o inimigo procurará empregar tropas especializadas, mas não poderá cobrir toda a região. Fará patrulhamento e tentará emboscar os guerrilheiros. Estes devem concentrar suas forças para realizar ações de certa envergadura, como as emboscadas.
Levar a cabo uma atividade permanente de fustigamento. Tornar difícil a vida dos soldados nas matas e corrutelas. Procurar apresar armas do inimigo. Criar depósitos operacionais.
Diminuir a intensidade do trabalho de massas e tomar o máximo de cuidado ao se aproximar das casas dos camponeses. Aplicar, sem a menor vacilação, as normas do trabalho de massas, de marcha, de acampamento, etc. é provável que o inimigo use esta forma de atuação em combinação com a terceira forma. A hipótese mais viável é que o Exército, na próxima investida, use a primeira forma.
No segundo, o inimigo procurará empregar tropas numerosas, chegando até a 20 mil homens, visando cercar e aniquilar as FF GG. Neste caso, os guerrilheiros devem atuar como no primeiro caso, tendo ainda mais cuidado no trabalho de massas. Na hipótese da situação se tornar muito difícil, procurar se esconder ou mesmo recuar temporariamente para outra área. Com grandes efetivos, as FF AA da reação não podem ficar muito tempo na região. Tudo indica que não poderão ficar mais de 2 meses (suas tropas não serão especializadas, terão grandes dificuldades para resolver os problemas de logística, será precário seu serviço de saúde, bem como seu serviço de transportes, etc). Talvez no mês de setembro a ditadura tente uma campanha de grande envergadura. Devemos estar preparados para tal emergência. Mas achamos pouco provável que se realize tal operação.
No terceiro, as FF GG devem dispersar seus efetivos para realizar o trabalho de propaganda e organização entre as massas. Procurar atingir áreas cada vez mais extensas. Organizar os camponeses e elevar o nível de sua consciência política. Melhorar o abastecimento, o armamento e o equipamento. Intensificar o recrutamento. Ocupar corrutelas, atacar postos policiais, punir bate-paus e ampliar o conhecimento do terreno.
Do ponto de vista dos seus efetivos, como devem atuar as FF GG? Em conjunto ou por Destacamento? Sua principal atuação é por Destacamento e, eventualmente, com todas as suas unidades.
Nossa perspectiva é estender nossa influência entre as massas. Estas são muito receptíveis à nossa propaganda. Como organiza-las? Das formas mais variadas, tudo dependendo do seu nível de consciência. Elas podem ser organizadas como “amigos da guerrilha”, em organizações de luta por suas reivindicações locais (contra o INCRA, contra os grileiros, etc), na ULDP, nas milícias e no P. devemos estender adjutórios e manter escolas. Ter como perspectiva o crescimento das FF GG com pessoas da região, sendo remota a possibilidade de recrutamento de combatentes vindos das cidades.
Se temos a perspectiva de criar uma área liberada, devemos, desde já, ter em vista os embriões doe poder local.
Devemos desenvolver a propaganda revolucionária, forjar a frente única e isolar a ditadura (no nosso caso, as FF AA do governo).
Tudo fazer para restabelecer a ligação com o exterior.
Devemos sempre nos ater à linha militar, obedecendo escrupulosamente as leis da guerrilha. Armar-se com as armas capturadas ao inimigo (as armas geram outras armas) e adquiridas entre a massa e através da massa.
No futuro, com o crescimento das FF GG, devemos enviar GG ou DD às regiões próximas.
Tê-las em vista desde já, levando sempre em conta a existência da mata e das massas.